OBSERVATÓRIO - Ocupação desaparece do Diário do Pará e O Liberal mantém postura contrária ao movimento

Este segundo relatório da cobertura sobre as ocupações feita pelos jornais Diário do Pará e O Liberal resulta do monitoramento realizado no período de 23 de novembro a 6 de dezembro. Assim, os dois relatórios até aqui finalizados acompanham os primeiros 30 dias de ocupação na Universidade Federal do Pará (UFPA), com coleta de material sobre a ocupação da UFPA e temas relacionados. A partir de um protocolo de análise, as informações foram agrupadas e tabeladas. Além da interpretação dos dados quantitativos, foi feita uma análise comparativa qualitativa sobre a cobertura de diferentes manifestações de rua. As principais considerações feitas a partir dos resultados deste boletim são as seguintes:
 - O Diário do Pará, que já havia feito uma cobertura episódica, embora equilibrada, no primeiro período de análise, ignorou completamente a ocupação dali em diante. Não houve mais uma nota sequer.
 - O Liberal manteve tanto uma cobertura jornalística minimamente contínua quanto uma postura editorial contrária à ocupação da UFPA, perceptível em sua principal coluna, o Repórter 70.


Diário do Pará

A tendência de invisibilização na cobertura do Diário do Pará, sinalizada no relatório anterior, é confirmada neste segundo momento de análise. Se, naqueles primeiros 16 dias, a cobertura ficou restrita basicamente à semana inicial do movimento, nos 14 dias que se seguiram o jornal não tratou mais da ocupação da UFPA em momento algum. O assunto simplesmente saiu da pauta.

Considerando questões outras de alguma forma relacionadas à ocupação, são 8 ocorrências encontradas no jornal, sendo 5 em matérias e 3 em colunas (ver gráfico 1).

Gráfico 1
Fonte: Dados da pesquisa

As matérias tratam dos seguintes temas: divulgação dos locais da segunda prova do Enem; desocupação em universidade no Paraná; protesto contra a PEC 55, em Belém; protesto contra o governo, em Brasília, por ocasião da votação da PEC 55; e aprovação do texto-base da PEC 55.

Já as colunas comentam sobre: a ocupação da escola Brigadeiro Fontenele, na Terra Firme (o Repórter Diário, por duas vezes); e visões da esquerda e dos governistas sobre a manifestação contra a PEC 55, em Brasília (a coluna nacional Panorama Político, de Ilimar Franco).

Em relação ao posicionamento do jornal, diferentemente do relatório anterior, não há ocorrências favoráveis. São 7 textos mais neutros e 1 contrário à ocupação (ver gráfico 2).

Gráfico 2
Fonte: Dados da pesquisa

Quanto às fontes, como as pautas desconsideraram o desenrolar da ocupação da UFPA, estudantes, professores e a própria universidade também acabaram saindo do rol das vozes ouvidas pelo Diário do Pará. Há 4 textos sem identificação de fonte, 2 com outros grupos sociais, 2 com outras instituições e 1 com políticos (ver gráfico 3).

Gráfico 3
Fonte: Dados da pesquisa



O Liberal

Como no relatório anterior, O Liberal manteve certa constância na cobertura da ocupação da UFPA. Das 8 ocorrências coletadas, entre as quais 4 em matérias e 4 em colunas (ver gráfico 4), apenas uma não trata diretamente do movimento.

Gráfico 4
Fonte: Dados da pesquisa

A matéria que não trata da ocupação relata a aprovação da PEC 55 em primeiro turno no Senado. Dos 7 textos encontrados sobre a ocupação, três são matérias: duas sobre portões fechados na UFPA e atualização do desenrolar da ocupação da UEPA; e uma sobre a vigília na reitoria da UFPA para acompanhar a votação da PEC 55. Ainda que tenha continuado, a cobertura propriamente jornalística sobre o movimento se tornou pontual no periódico, considerando que os dois primeiros textos referem-se, mais especificamente, sobre a ocupação da UEPA, destinando apenas o primeiro parágrafo para tratar da UFPA. 

Nas colunas, a posição do Repórter 70 contrária ao movimento, já evidenciada no relatório anterior, é reiterada. Há quatro notas coletadas da coluna que apresenta a opinião de O Liberal. Os temas: crítica à nota em que o reitor se solidariza com a ocupação e põe-se contra a PEC 55; aumento no número de professores que ocupam a reitoria; iminência de greve dos professores; questionamento à legitimidade das assembleias gerais de docentes.

Em relação ao posicionamento do jornal, mantém-se também uma postura relativamente equilibrada na cobertura jornalística e negativa ou contra a ocupação na parte editorial. Ao todo, são 6 textos mais neutros e 2 contrários à ocupação, ambos da coluna Repórter 70 (ver gráfico 5).

Gráfico 5
Fonte: Dados da pesquisa

Quanto às fontes, estudantes e professores continuam a ter razoável relevância. Foi acrescentada, neste segundo relatório, a categoria dos técnicos, que não havia sido separada anteriormente. As três categorias juntas mais a universidade representam mais de 60% das fontes ouvidas. Cabe pontuar, contudo, que nem todos os professores e estudantes citados no jornal são favoráveis à ocupação.

Os estudantes são fonte em 3 textos, os professores, em 4, os técnicos, em 2. Há ainda a universidade (1), políticos (3), outros grupos sociais (1) e texto sem identificação de fonte (1) (ver gráfico 6).

Gráfico 6
Fonte: Dados da pesquisa



Comparação entre manifestações de rua

Três manifestações de rua marcaram o período de análise deste relatório: duas contra a PEC 55 (dias 25 e 29 de novembro), sendo uma em várias cidades do país e outra em Brasília, no dia da votação em primeiro turno pelo Senado; e uma contra a corrupção e em defesa da operação Lava Jato (dia 4 de dezembro). Embora esse último protesto não tenha entrado na coleta sobre a ocupação, optamos por considerá-lo aqui para efeito de comparação de coberturas.

O Diário do Pará ignorou o ato contra a PEC 55 que ocorreu em Belém, dia 25 de novembro, na semana anterior à votação em Brasília. Nada foi publicado. Já as notícias sobre as outras duas manifestações são sucintas, com textos curtos e foto pequena (ver imagem 1). Há, no entanto, diferenças de enquadramento.

Imagem 1 - Matérias Diário do Pará


Fonte: Diário do Pará

No protesto de Brasília, em que houve confronto entre a polícia e manifestantes, o texto fala em “depredação”, “ministérios vandalizados” e classifica os atos da polícia como uma “reação”. Se, nesse caso, não há fontes citadas, o texto do protesto contra a corrupção tem depoimentos de estudante, uma aposentada e um vigilante. Os manifestantes, assim, ganham rostos. Apesar de ser notícia pequena, tem chamada de capa.

Cabe pontuar que o texto do ato de Brasília é de agência de notícia, enquanto que o do protesto contra a corrupção é assinado por uma repórter do jornal.

Como o Diário do Pará, O Liberal desconsiderou o ato contra a PEC 55 do dia 25 de novembro. Já na cobertura da manifestação do dia 29, em Brasília, a primeira fonte, citada ainda no parágrafo inicial, é a polícia. No parágrafo seguinte, diz-se que o uso de bombas, gás e cassetete foi “para conter o grupo”, no caso, os manifestantes. A invasão do espelho d’água do Congresso teria sido o ponto de partida para a polícia agir. A única fonte ouvida por parte dos manifestantes é a União Nacional dos Estudantes, em nota, no último parágrafo do texto. Uma continuação da matéria indica as reações do governo e da oposição ao ocorrido.

O texto sobre o protesto em defesa da Operação Lava Jato, do juiz Sergio Moro e contra a corrupção classificou o ato como “bem eclético”, tendo participado “desde categorias profissionais, como auditores fiscais da Receita Federal do Brasil (RFB), até grupos mais conservadores, que defendiam a volta da monarquia no Brasil”. Vários manifestantes são fontes do texto.

Também em O Liberal, a matéria sobre o ato em Brasília é de uma agência de notícia. A que relata a manifestação contra a corrupção em Belém é produção do jornal, embora não seja assinada. As duas ocupam página inteira, tendo quase o mesmo destaque, sendo que a manifestação contra a corrupção virou manchete de capa da edição de segunda-feira do jornal. Enquanto na primeira o fogo de um carro incendiado é o destaque da foto - em diálogo com a narrativa do vandalismo -, a segunda traz bandeiras do Pará e do Brasil (violência x patriotismo) (ver imagem 2).

Imagem 2 - Matérias de O Liberal


  Fonte: O Liberal

No mesmo dia em que foi publicada a matéria sobre o ato de Brasília, O Liberal traz também texto sobre a vigília na UFPA para acompanhar a votação da PEC 55. O texto cita indiretamente este Observatório, ao se referir à mesa de debate “sobre a cobertura da mobilização em Brasília pela mídia” (ver imagem 3).

Imagem 3 - Matéria O Liberal

Fonte: O Liberal


Reaproveitamento de texto

Uma prática um tanto problemática foi identificada, tanto no Diário do Pará quanto em O Liberal, a partir do material coletado. Nos dois jornais, há textos que são publicados num certo dia e, dois dias depois, são publicados novamente, sem qualquer aviso de que se trata de uma repetição.

No caso do Diário do Pará, o ocorrido aparece nas colunas Repórter Diário dos dias 26 e 28 de novembro. As notas sobre a ocupação da escola Brigadeiro Fontenele, na Terra Firme, são alteradas apenas quanto à questão temporal (ver imagem 4).

Imagem 4 - Notas do Repórter Diário (Linha Direta)
 
Fonte: Diário do Pará

Já em O Liberal, o reaproveitamento foi de matéria jornalística. O texto da matéria “Movimento contra a PEC 45 fecha de vez campus da UFPA”, publicada dia 26 de novembro – que cita o número errado da PEC 55 –, é basicamente o mesmo do que foi publicado dia 28 com título “UFPA sob bloqueio e Uepa à meia-boca”. Além do título, mudam apenas subtítulos, fotos e legendas (ver imagem 5).

Imagem 5 - Matérias de O Liberal

Fonte: O Liberal


Talvez essa prática tenha relação com a precarização dos trabalhos nas redações de Belém. Mas certamente sinaliza um desrespeito com o público leitor.

***

Entre 23 de novembro e 6 de dezembro, o Diário do Pará continua a invisibilizar a ocupação da UFPA, como passou a fazer logo após a primeira semana do movimento. Nenhum comentário ou notícia foi publicado no período de análise. Como consequência, estudantes, professores e a universidade não aparecem como fontes do material coletado. Já O Liberal mantém uma cobertura relativamente contínua, com estudantes, professores, a universidade e também servidores representando mais de 60% das fontes, no entanto, segue editorialmente contrário à ocupação.

Quanto à cobertura de protestos de rua, os dois jornais ignoram o que ocorreu dia 25 de novembro (contra a PEC 55) e reservam espaços parecidos para os atos dos dias 29 novembro (em Brasília, contra a PEC 55) e 4 de dezembro (em defesa da Operação Lava Jato e contra a corrupção), mas enquadramentos bem distintos, sendo o do dia 29 criminalizado e o do dia 4 humanizado.

Este relatório destaca ainda a prática de republicação de textos, que aparece também nos dois jornais. O Diário do Pará reaproveitou o texto de uma nota e publicou novamente dois dias depois na mesma coluna, o Repórter Diário. O Liberal repetiu matéria jornalística dois dias após a publicação original, mudando foto, título e legenda.
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